O fim do "clearing" de dólares, transação de compra e venda do dólar, por parte do Deutsche Bank ao país nos finais de 2016 deixou Angola numa posição mais difícil em termos de acesso às divisas.
E considerando a dificuldades de vária ordem que a banca angolana tem enfrentado, o Fundo Monetário Internacional (FMI) sugeriu que o Banco Nacional de Angola (BNA) tomasse algumas medidas a fim de tornar a banca estável. É que várias irregularidades foram constatadas, algumas delas cometidas pelo próprio Governo. Sobre o tema a DW África entrevistou o economista angolano Precioso Domingos.
Angola vive uma falta de divisas e por outro lado tem a sua credibilidade manchada no sistema financeiro internacional, devido a falta de transparência. Em que medida esses factos podem desencadear uma crise bancária
Precioso Domingos (PD): Sim, de facto. Por um lado estamos a falar de um problema de liquidez que a própria banca já vai vivendo, mas se olharmos do ponto de vista das divisas, isto é um canal de risco justamente porque Angola está numa situação muito complicada do ponto de vista de reservas internacionais. Até já existem rumores de que provavelmente o nível de reservas internacionais que o país possui talvez não seja o que o Banco Nacional de Angola (BNA) vai divulgando. E isso depois vai se evidenciando também pela apatia do BNA em vender divisas. Isso quer dizer que, se o BNA não se tornar imediatamente corajoso o suficiente para desvalorizar o Kwanza, no sentido de fazer com que os poucos dólares que existem na economia sejam efetivamente canalizados para o setor real e que a banca não tenha muitos problemas em termos de acesso às divisas, claramente estou a ver, por um lado, o próprio Governo a entrar em bailout, ou seja, resgate. E se o Governo entrar em bailout isso certamente levar consigo a própria banca, que é muito dependente do Governo.
O FMI recomendou recentemente uma avaliação de ativos bancários, a recapitalização de bancos considerados mais fracos e o encerramento de bancos com capacidade operacional fraca. Que implicações isso teria para o setor bancário angolano já abalado?
Há muitos bancos que podem ir a falência, sobretudo os públicos. Não há outra solução se não a recapitalização dos mesmos. E no caso da banca pública, obviamente que quem tem de recapitalizar é o Estado, ou o Governo, enquanto gestor. Mas o que está aqui em causa é que até agora não se investiga porque é que esses bancos acabaram por ficar sem liquidez, a quem efetivaram os empréstimos e por que não há condições de os mesmos serem devolvidos. É que esse dinheiro foi emprestado a um conjunto de pessoas muito bem identificadas, que ficaram ricas através desses empréstimos, não devolvem e agora vem o Governo injetar dinheiro novamente nesses bancos. Do ponto de vista da banca privada, o que está em causa, na verdade, é que o próprio Governo é o grande devedor, o grande papão do crédito na economia angolana. E no fundo o que o FMI aconselha, e é uma das formas de se recapitalizar a banca privada, é o Governo pagar as dívidas.
O nível do crédito mal parado em Angola triplicou entre 2010 e 2016, o que deixa o bancos impossibilitados de cumprir com as suas funções, como por exemplo fornecer créditos aos setores produtivos. Que saídas restam a esses setores numa altura em que o país vive uma crise financeira e económica?
Em princípio começam a ficar limitados do ponto de vista de investimento para continuarem a funcionar, bem como do ponto de vista do surgimento de novos setores da atividade económica. Mas se por um lado a própria banca já está muito exposta, há um crédito mal parado, tudo porque agentes privados como o próprio Governo estão na lista dos grandes credores da banca, a própria política que o Governo vem seguindo até aqui, de contínuo endividamento, não facilita. Ainda que essa banca tivesse dinheiro as taxas de juro que ela pratica, nomeadamente para esses setores que hoje em dia estão sem possibilidades de investir, certamente não geram atratividade por parte da banca.
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