Angola quer ser compensada para abdicar do papel preponderante do petróleo no seu desenvolvimento. Esta é uma das exigências que o país trouxe na bagagem à cimeira do clima de Paris, onde está a ser discutido um novo tratado para limitar as alterações climáticas.
A delegação de Angola fica no extremo de um dos pavilhões de madeira reciclada do centro de exposições de Le Bourget, onde se realiza esta conferência das Nações Unidas. Mas o país está no centro das negociações. Preside ao grupo dos países menos desenvolvidos, assim reconhecidos pela ONU, mas ao qual está em vias de deixar de pertencer. São 48, a maior parte de África. "Somos os mais vulneráveis", diz ao PÚBLICO a ministra do Ambiente, Maria de Fátima Jardim.
No caso de Angola, esta vulnerabilidade é dupla. As alterações do clima, sustenta a ministra, estão a ter consequências visíveis, sobretudo nas regiões mais a sul. "O deserto está a aumentar, e não é por acção humana que isto se verifica. É uma das zonas menos povoadas do país", explica, acrescentando: "Cerca de 31% da superfície do nosso território estão afectados pela seca e pela desertificação."
A ajuda à adaptação das nações mais pobres a um mundo mais quente é um dos pontos mais espinhosos das negociações de Paris. Os países desenvolvidos já tinham prometido contribuir com 100 mil milhões de dólares (92 mil milhões de euros) por ano, a partir de 2020. Mas não está definido de onde virá este dinheiro, nem a quem e como será distribuído.
O Governo angolano estima que precisará de mil milhões de dólares (918 milhões de euros) para pôr em prática várias medidas de adaptação que estão planeadas. E para conter o aumento das suas emissões de gases com efeito estufa, serão necessários mais 15 mil milhões de dólares (14 mil milhões de euros). "Multiplique as nossas necessidades pelas de todos os outros países. Cem mil milhões não chegam", antecipa Maria de Fátima Jardim.
O principal problema do país, no entanto, está naquilo que o sustenta neste momento: o petróleo, um combustível que o mundo terá de deixar de utilizar nas próximas décadas, se se quiser garantir um clima viável para a humanidade no futuro. Mesmo antes de qualquer acordo em Paris que torne mais difícil utilizar combustíveis fósseis no futuro, há consequências actuais palpáveis desta dependência.
Angola tinha todos os seus planos de desenvolvimentos baseados num preço médio de 80 dólares (73 euros) para o barril de petróleo. Mas o valor está perto de 40 dólares (36 euros). "Vimos o nosso orçamento baixar para a metade. Quem é que nos compensa? Outros países estão a sair beneficiados com isso", afirma a ministra do Ambiente.
A saída está em ampliar a base da economia angolana. E é nessa área que o país reclama também mais apoios. "Podemos ser ajudados na diversificação económica e em projectos de adaptação climática", resume Maria de Fátima Jardim.
A reivindicação de Angola exemplifica a complexa teia de interesses em jogo na cimeira do clima em Paris, no que toca ao financiamento. Os 100 mil milhões de dólares anuais prometidos deverão servir para "atender as necessidades do países em desenvolvimento", segundo uma decisão tomada pela ONU em 2010. Mas ajudar um dos 48 países menos desenvolvidos não é o mesmo que ajudar a China, hoje a segunda maior economia mundial.
E mesmo Angola poderá sair em breve do grupo dos mais pobres, tendo já iniciado, com as Nações Unidas, um processo neste sentido. O seu rendimento bruto per capita em 2014 equivalia a cerca de 4500 euros, segundo dados do Banco Mundial. O da Guiné-Bissau, que está no mesmo grupo, era de 510 euros.
"Naturalmente que ainda existem algumas debilidades, mas não há dúvida de que Angola está a crescer. Continuam a melhorar os índices de desenvolvimento humano, a qualidade de vida está a melhorar, os níveis de pobreza reduziu-se significativamente", diz a ministra do Ambiente. "Nós próprios queremos ser correcta e justamente avaliados e classificados", acrescenta.
Por ora, no entanto, o país é o porta-voz das nações menos avançadas nas discussões em Paris. "Não queremos só participar de mão estendida. Queremos participar também na redução de emissões", refere Maria de Fátima Jardim.
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