AUGUSTO CAMPOS | LUANDA: Foi no sufoco, de virada, com muito nervosismo e com uma ajudinha da
arbitragem, mas o Brasil abriu a vigésima edição da Copa do Mundo, nesta
quinta-feira, derrotando a Croácia, no Itaquerão, em São Paulo: 3 a 1,
gols de Neymar, duas vezes, e Oscar, já no finzinho. Marcelo abriu o
placar marcando contra, no início de jogo. Com a vitória, a equipe de
Luiz Felipe Scolari sai na frente na classificação do Grupo A e dá o
primeiro passo rumo ao seu sexto título mundial. O próximo desafio é
contra o México, no Castelão, em Fortaleza, na terça-feira. Até lá,
Felipão ainda terá de corrigir as falhas que tornaram a partida
inaugural tão difícil – algo já esperado, diga-se, tanto pelo
adversário, que conta com bons jogadores, como Modric e Olic, como pelo
retrospecto (nas últimas Copas, o Brasil sempre venceu de forma apertada
na estreia). Não foi só a seleção que ficou abaixo do esperado: a festa
de abertura, com uma cerimônia bastante pobre e fria, teve repercussão
negativa no estádio e ao redor do mundo. A presidente Dilma Rousseff,
que foi ao Itaquerão, também não teve uma boa tarde: em três ocasiões
diferentes, foi xingada em coro pelo público, mesmo não tendo discursado
nem sido anunciada pelos alto-falantes.
Início tenso - Sentindo o peso da estreia e do
favoritismo, o Brasil teve um início hesitante no jogo, mostrando certo
nervosismo em alguns lances. Os croatas, enquanto isso, aproveitavam o
fato de jogarem sem nenhum peso sobre os ombros: tentavam controlar o
jogo e não se contentavam em apenas defender. O primeiro susto para os
brasileiros veio aos 6 minutos, quando o ótimo Modric disparou pelo meio
e conseguiu alçar a bola para Olic concluir com extremo perigo – a bola
saiu pelo lado direito do goleiro Júlio César. Aos 10 minutos, o
primeiro gol da vigésima Copa do Mundo foi marcado por um brasileiro –
mas contra sua própria meta. Depois de um cruzamento rasteiro do
experiente Olic pela direita, a bola passou por David Luiz e acabou
sendo desviada por Marcelo, que tentou cortar e empurrou para as redes. A
torcida, que até então apoiava com gritos esporádicos, reforçou seu
incentivo à equipe, com gritos de “Brasil”. Quatro minutos depois, com
boa parte do público jogando junto, Oscar cruzou da direita, mas Neymar e
Fred não alcançaram. O camisa 11, que havia sido muito criticado nos
dois amistosos de preparação, fazia boas jogadas pelo lado do campo e
aparecia como melhor opção ofensiva do time.
O Brasil seguia tentando igualar o placar: aos 20, Paulinho, uma das
melhores alternativas de Felipão para jogos em que o adversário se fecha
na defesa, se infiltrou na área e chutou com perigo; o goleiro
Pletikosa fez boa intervenção. No minuto seguinte, Neymar disparou pela
direita, foi ao fundo e cruzou. A zaga rebateu e, no rebote, Oscar
chutou com efeito, exigindo uma incrível defesa de Pletikosa. Explorando
a ansiedade dos brasileiros, a Croácia começou a tentar ganhar tempo,
demorando a cobrar suas bolas paradas e esfriando o jogo depois de cada
falta. O time da casa sentia a pressão e errava muitos passes. Aos 26
minutos, Neymar golpeou a cabeça de Modric numa dividida pelo alto e
levou o cartão amarelo do árbitro Yuichi Nishimura – o mesmo que
expulsou Felipe Melo na eliminação do Brasil diante da Holanda, no
último Mundial. Aos 28, outro cruzamento perigoso dos croatas e outra
cabeçada perigosa, desta vez de Jelavic, o substituto do artilherio
Mandzukic, suspenso. Júlio César subiu bem e agarrou.
Logo em seguida, a estrela maior do Brasil enfim começava a brilhar
na Copa: Neymar recebeu na intermediária, ajeitou e bateu de perna
esquerda, cruzado, meio mascado, mas com a direção exata: a bola bateu
mansamente na trave esquerda de Pletikosa e entrou. O Itaquerão enfim se
transformava num caldeirão para os donos da casa. Empurrados pelo
público, os comandados de Felipão logo partiram em busca do segundo, mas
a Croácia, uma equipe experiente e bem postada em campo, sabia conter o
ímpeto dos favoritos. A seleção europeia procurava trocar muitos passes
e manter a posse de bola. O Brasil preferia não esperar: quando
recuperava a bola, tentava agredir rapidamente, em investidas de Hulk e
Oscar pelos lados e arrancadas de Neymar pela faixa central. Aos 44,
Neymar aproveitou uma bobeira de Olic, roubou a bola e invadiu a área,
mas não conseguiu achar uma brecha para o arremate. A bola sobrou para
Hulk, que chutou forte, mas muito alto. O Brasil encerrava a primeira
etapa aparentemente recuperado do baque de ter saído em desvantagem no
marcador. A Croácia, contudo, dava sinais claros de que venderia muito
caro a derrota.
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Virada - A segunda etapa começou com a Croácia mais
recolhida em seu campo defensivo, tentando segurar o Brasil nos minutos
iniciais para só depois especular algum contra-ataque. Diante de um
oponente fechado e muito competitivo, o time de Felipão sofria para
encontrar um caminho até o gol. Os erros de passes continuavam e levavam
Scolari ao desespero na beira do campo. Tentando melhorar a qualidade
dos passes, Felipão trocou Paulinho por Hernanes. A Croácia, por sua
vez, aumentava seu domínio da bola e saía aos poucos ao ataque. Numa
roubada de bola de Neymar, aos 20 minutos, o craque quase conseguiu
deixar Fred na cara do gol, mas foi derrubado por Corluka. Daniel Alves
bateu a falta da entrada da área mas chutou sobre o gol. Felipão trocou
Hulk por Bernard, o caçula do grupo. Logo em seguida, Fred, que estava
sumido no jogo, fez o pivô, tentou girar para bater, recebeu um leve
puxão no ombro e desabou, cavando um pênalti mais que providencial.
Neymar bateu e, aos 25, virou o jogo para o Brasil. Pletikosa chegou a
espalmar, mas não impediu que a bola entrasse. Até o fim do jogo, a
Croácia brigou muito e ameaçou várias vezes a meta brasileira, mas o
último gol do jogo foi de Oscar, que arrancou em velocidade, já nos
acréscimos, para selar a vitória.
Falhas e xingamentos - Nos instantes que antecederam
o jogo, a Fifa voltou a dar uma forcinha a Felipão: repetindo o
protocolo das partidas da Copa das Confederações, no ano passado, a
organização só tocou a primeira parte do Hino Nacional, dando a deixa
para que os torcedores cantassem os demais trechos a plenos pulmões,
incendiando a equipe da casa. Antes do pontapé inicial, o trio de
arbitragem reuniu os jogadores de Brasil e Croácia ao redor do círculo
central para uma cerimônia simbólica pedindo “paz, tolerância e respeito
aos direitos humanos”, em nome da Fifa e da ONU (o secretário-geral Ban
Ki-moon estava na tribuna de honra ao lado da presidente Dilma
Rousseff). Com três pombas brancas soltas a partir do centro do campo, a
Fifa declarava aberta a Copa do Mundo. Normalmente, a tarefa cabe ao
chefe de Estado do país-sede, mas o temor de que a vaia ouvida na
abertura da Copa das Confederações se repetisse afastou Dilma tanto do
microfone como do campo de visão do público. Não adiantou: pela segunda
vez na tarde desta quinta, a presidente era alvo de um xingamento
obsceno em coro (ela já havia sido xingada logo depois da cerimônia de
abertura).
Não foi a única dor de cabeça das autoridades brasileiras: logo no
primeiro minuto, parte da iluminação se apagou. Em um quarto da fila de
refletores que contorna a cobertura do Itaquerão, as luzes ficaram
apagadas por cerca de sete minutos. Passados outros sete minutos, em que
os refletores lentamente começaram a se acender, novo apagão nos mesmos
lugares do topo do estádio. Como ainda estava claro, não houve qualquer
interrupção na partida – e quando anoiteceu, a iluminação não voltou a
falhar, para alívio dos organizadores. Para as cerca de 62.000 pessoas
presentes ao jogo inaugural da Copa, a abertura transcorreu com pequenos
problemas, mas sem falhas capazes de comprometer a realização da
partida. Muitos torcedores reclamaram das filas longas demais nos bares e
restaurantes, da falta de comida em alguns pontos de venda perto do
início do jogo e da falta de informações precisas para conseguir
encontrar seu assento no estádio. Assim como a falha na iluminação, são
defeitos que poderiam ter sido corrigidos caso o Itaquerão tivesse sido
testado adequadamente nos meses que antecederam o Mundial. Entregue em
cima da hora, o estádio acabou sendo palco de uma abertura ao modo
brasileiro.